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Il doit s’imaginer la féerie paysagiste de Rio et se dire que peu a peu et invinciblement, la technique des pilotis et des brise-soleil s’est emparée de tout le Brésil, et que désormais cette nature tropicale constituera le plus merveilleux cadre à la sensation architecturale.
Le Corbusier, Œuvre Complète, 1938-1946

O livro Moderno tropical: arquitectura em Angola e Moçambique, 1948--1975, com texto de Ana Magalhães e fotografias de Inês Gonçalves, foi editado pela Tinta-da-China e lançado em Lisboa no início de Dezembro do ano passado. É o resultado de duas breves viagens a Angola e a Moçambique, etapas iniciais do doutoramento em arquitectura da primeira das autoras, com o objectivo de reconhecer e registar fotograficamente a arquitectura moderna do período colonial ainda existente.
     O campo de análise do livro circunscreve-se fundamentalmente às quatro cidades então visitadas – Luanda, Lobito, Maputo e Beira –, e a uma selecção de edifícios nelas construídos. Posteriores pesquisas em fontes bibliográficas e documentais, assim como testemunhos de autores e de seus familiares, suportam a linha interpretativa agora apresentada: a predominante filiação da produção arquitectónica ultramarina no Estilo Internacional do pós-guerra através dos modelos da moderna arquitectura brasileira, amplamente difundida a partir da exposição Brazil builds e da edição do respectivo catálogo em 1943.
     Buscando um científico rigor de análise, patente na constante preocupação de referenciar as fontes e de completar o discurso com notas de rodapé, o livro assume-se como um ensaio académico, “um primeiro guião no quadro de uma investigação mais vasta”. Assim se entende o papel principalmente ilustrativo concedido às fotografias de Inês Gonçalves, cuja intensidade permite adivinhar a construção de um discurso conceptual autónomo.
     Antecedido por um belo prefácio da investigadora Ana Tostões, e por uma apresentação onde se descrevem as circunstâncias específicas que originaram a publicação, um conjunto de cinco capítulos (ou de categorias de análise), estruturam o livro numa clara sequência de natureza temática:
     • “Moderno e tropical” contextualiza historicamente os antecedentes do período em estudo, com especial enfoque no despertar de uma consciência arquitectónica moderna em Portugal – a partir do I Congresso do Sindicato dos Arquitectos em 1948 –, e na estreita relação entre o pensamento, a obra e a acção de Le Corbusier e a génese da moderna arquitectura brasileira;
     • “Utopia moderna em África” enquadra histórica e geograficamente as quatro principais cidades dos dois países e descreve em quatro subcapítulos – “Grelhas e brise-soleil”, “Plasticidade”, “Varandas, caixas e outras saliências” e “Pastilhas, cores e outras texturas” – as principais invariantes gramaticais detectadas;
     • “Tipologias tropicais” organiza em quatro subcapítulos – “Cine-esplanadas: a boa vida”, “Igrejas: uma resposta tropical”, “Galerias: o caso da habitação colectiva” e “À procura da obra global: arte e arquitectura” –, os temas principais onde se detectam constantes programáticas, espaciais e metodológicas modernas;
     • “Doze obras” expõe uma reportagem fotográfica que se inicia com imagens do Mercado do Kinaxixe, em Luanda, imediatamente anteriores à sua demolição, e prossegue com um conjunto exemplar de doze edifícios das quatro cidades – Edifício Alfredo Matos (Ministério do Urbanismo e Obras Públicas) e Centro de Radiodifusão de Angola (Rádio Nacional de Angola), em Luanda, Edifício da Universal e Liceu Nacional Almirante Lopes Alves (Escola do 3º Nível Comandante Saydi Mingas), no Lobito, Edifício Abreu, Santos e Rocha, Casa do Dragão, Liceu D. Ana da Costa Portugal (Escola Secundária da Polana) e Fábrica A Reguladora de Moçambique (Armazéns LusoVinhos), em Maputo, e, por fim, a Estação de Caminhos de Ferro, o edifício do Automóvel Touring Club (Palácio dos Casamentos) e o Pavilhão do Clube Ferroviário, na Beira;
     • “Oito arquitectos”, disponibiliza a informação biográfica sobre os principais autores das obras referidas – Vasco Vieira da Costa, Francisco Castro Rodrigues, Fernão Simões de Carvalho, Pancho Guedes, João José Tinoco, João Garizo do Carmo, Paulo de Melo Sampaio e Francisco de Castro –, parte de um conjunto maior de arquitectos portugueses que com relevo exerceram a sua profissão em Angola e em Moçambique.
     A concluir o livro uma “Breve cronologia” confronta entre si os principais acontecimentos internacionais, metropolitanos e ultramarinos, de natureza sociopolítica ou arquitectónica, ocorridos durante o período em análise, e um “Inventário das Obras Fotografadas” organiza em fichas informativas individuais os edifícios referenciados ao longo das viagens. O livro completa-se com uma extensa bibliografia, agradecimentos e notas biográficas das autoras.
     Moderno tropical não pretende constituir-se em obra final sobre a arquitectura moderna das antigas colónias/províncias ultramarinas portuguesas ou sobre as possíveis relações entre diferentes arquitecturas com afinidades geográficas e culturais. A sua grande qualidade reside na exposição e interpretação de parte significativa do conhecimento existente sobre este tema específico. Constitui assim um contributo para a definição dos contornos de um vasto território inexplorado, cujo desbravamento se torna essencial para o cabal esclarecimento da história da arquitectura do Movimento Moderno em Portugal.|

 


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